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Relatório final pede indiciamento de Bolsonaro por golpe de Estado

Relatora da CPMI do Golpe, a senadora Eliziane Gama defende que Bolsonaro responda também pelos crimes de associação criminosa, violência política e abolição violenta do Estado Democrático de Direito

17/10/202304:00:00

Relatório final pede indiciamento de Bolsonaro por golpe de Estado
Parlamentares acompanham leitura do relatório: pedidos de indiciamento incluem 8 generais ligados a Bolsonaro (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

O relatório final da CPMI do Golpe (acesse aqui a íntegra do documento), apresentado nesta terça-feira (17) pela senadora Eliziane Gama (PSD-MA), responsabiliza Jair Bolsonaro e dezenas de seus apoiadores pelo “maior ataque à democracia de nossa história recente”.

O documento, lido pela relatora durante sessão da comissão parlamentar mista de inquérito, também pede o indiciamento (abertura de inquérito) tanto do ex-presidente como de centenas de seus apoiadores (veja a lista completa no fim da matéria).

Segundo a relatora, Bolsonaro foi o autor intelectual e moral de um movimento golpista que culminou nos atentados de 8 de janeiro de 2023, devendo ser responsabilizado pelo seguintes crimes: associação criminosa, violência política, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

Após a leitura do relatório pela senadora Eliziane Gama, a oposição apresentou um voto em separado, no qual insistiu na patética tentativa de responsabilizar o governo Lula pelos atentados do dia 8. O debate sobre as conclusões da relatora e a votação para que a comissão aprove ou rejeite seu documento ocorrerão na quarta-feira (18). Se aprovado, será enviado ao Ministério Público Federal (MPF), que decidirá se abrirá ou não os inquéritos.

Parlamentares do PT que integram a CPMI elogiaram o trabalho da relatora. "Numa tacada só, indiciou 61 nomes, incluindo Bolsonaro e mais 30 militares", escreveu o deputado Rogério Correia (PT-MG) nas redes sociais. Já seu colega de Bancada Rubens Pereira Jr (PT-MA) celebrou o fato de o documento ter colocado Bolsonaro no centro da trama golpista e lembrou que os crimes apontados ao ex-presidente somam 29 anos de prisão.

“Obra do bolsonarismo”

Segundo Eliziane Gama, a CPMI se dedicou, nos últimos cinco meses, a entender como foi possível que alguns milhares de insurgentes invadissem e depredassem as sedes dos Três Poderes. E, para que essa resposta seja alcançada, é preciso entender que o 8 de Janeiro começou a ser forjado muito antes, com ataques sistemáticos à democracia e manipulação dos fatos (baixe aqui a Linha do Tempo do golpe).

“A democracia brasileira foi atacada: massas foram manipuladas com discurso de ódio; milicianos digitais foram empregados para disseminar o medo, desqualificar adversários e promover ataques ao sistema eleitoral; forças de segurança foram cooptadas; tentou-se corromper, obstruir e anular as eleições; um golpe de Estado foi ensaiado; e, por fim, foram estimulados atos e movimentos desesperados de tomada do poder”, escreve a relatora, antes de concluir: “O Oito de Janeiro é obra do bolsonarismo”.

LEIA MAIS: As narrativas que levaram ao 8 de janeiro

Assim, não é possível acreditar que o 8 de Janeiro tenha sido um movimento espontâneo ou desorganizado, muito menos ordeiro e pacífico, afirma a relatora. E o objetivo final era, sim, um golpe de Estado.

Tanto no 8 de Janeiro quanto em ações anteriores — como os ataques em Brasília na noite de 12 de dezembro e a tentativa de explodir um caminhão-tanque no aeroporto da capital federal — a ideia era viabilizar a decretação de um estado de sítio ou de GLO (Garantia da Lei e da Ordem), levando os militares ao controle do país.

“Para os que nele tomavam parte — mentores, executores, instigadores, financiadores, autoridades omissas ou coniventes —, o Oito de Janeiro foi uma tentativa propositada e premeditada de golpe de Estado. O objetivo era um só: invadir ou deixar invadir as sedes dos Poderes, desestabilizar o Governo, incendiar o País, provocar o caos e a desorganização política — e até mesmo, se necessário, uma guerra civil”, diz um trecho do relatório.

“Ainda não terminou”

O documento lembra ainda que, enquanto a massa de golpistas era mobilizada, Bolsonaro tentava convencer oficiais das Forças Armadas a aderir ao golpe, ao passo em que figuras próximas ao ex-presidente elaboravam documentos que buscavam dar ao golpe “o verniz jurídico com que tanto sonham os ditadores”.

Mesmo assim, a democracia resistiu. “Contra os golpistas, prevaleceu a solidez de nosso arranjo institucional”, celebra a relatora. Ela, no entanto, deixa um alerta, ao lembrar que os golpes de hoje não se dão apenas com o uso da força, mas justamente com as armas empregadas pelo bolsonarismo: mentiras, campanhas difamatórias, propaganda subliminar, disseminação do medo, fabricação do ódio.

“As invasões do dia 8 de janeiro fracassaram em seus objetivos mais escuros. Mas os ataques à democracia continuam. (…) O Oito de Janeiro ainda não terminou. Urge que o sistema de vigilância seja permanente”, propõe

O papel de Bolsonaro

O relatório também detalha o papel exercido por Jair Bolsonaro na trama golpista. A relatora lembra que o ex-presidente nunca nutriu simpatia por princípios democráticos, e, desde o primeiro dia de governo, atentou contra instituições estatais, “principalmente aquelas que significavam, de alguma forma, obstáculo ao seu plano de poder”.

No cargo de presidente, diz o documento, “Bolsonaro se utilizou como pôde do aparato estatal para atingir seu objetivo maior: cupinizar as instituições republicanas brasileiras até seu total esfacelamento, de modo a se manter no poder, de forma perene e autoritária”.

Assim, o relatório atribui a Bolsonaro responsabilidade direta, como mentor moral, por grande parte dos ataques perpetrados a todas as figuras republicanas que impusessem qualquer tipo de empecilho à sua empreitada antidemocrática.

“Agentes públicos, jornalistas, empresários, militares, membros dos Poderes: todos sofreram ataques incessantes por parte de Jair Bolsonaro e de seus apoiadores, muitos deles ocupantes de cargos públicos, que se utilizavam da máquina estatal para coagir e agredir pessoas”, denuncia o relatório.

É lembrado ainda que Bolsonaro atacou por diversas vezes o processo eleitoral, chegando a vazar o teor de um processo sigiloso em uma de suas lives, a mentir sobre a insegurança das urnas eletrônicas em reunião com embaixadores estrangeiros e a se reunir com o hacker Walter Delgatti com o objetivo de desacreditar as urnas eletrônicas.

Os crimes atribuídos a Bolsonaro

Depois das eleições de 2022, prossegue o documento, Bolsonaro ainda se reuniu por diversas vezes com os comandantes das Forças Armadas, fora da agenda presidencial oficial, com fins pouco republicanos, e nunca se disse contrário aos acampamentos golpistas que se formavam diante de quartéis do Exército Brasileiro.

Por fim, o relatório lembra que, segundo noticiado pela imprensa, Filipe Martins, então assessor internacional da Presidência da República, entregou em mãos a Bolsonaro uma “minuta de golpe”, fato que teria sido presenciado por Mauro Cid, ex-ajudante de ordens que fechou acordo de delação premiada.

“Os fatos aqui relatados demonstram, exaustivamente, que Jair Messias Bolsonaro foi autor, seja intelectual, seja moral, dos ataques perpetrados contra as instituições, que culminaram no dia 8 de janeiro de 2023. Por esse motivo, deve ser responsabilizado pelos tipos penais descritos nos arts. 288, caput (associação criminosa), 359-P (violência política), 359-L (abolição violenta do Estado Democrático de Direito) e 359-M (golpe de Estado), todos do Código Penal, por condutas dolosas”, afirma o texto.

Veja a lista de pedidos de indiciamento feitos pela CPMI do Golpe

Segundo o relatório, a lista abaixo (organizada desta forma pelo site Congresso em Foco) inclui todas as pessoas que, segundo os indícios, podem ter agido como mentores; executores, por ação ou omissão; instigadores; ou financiadores.

MENTORES

Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa;
Augusto Heleno, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional);
Luiz Eduardo Ramos,  ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência;
Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa;
Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha;
Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército;
Mauro Cesar Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
Luís Marcos dos Reis, sargento do Exército e ex-integrante da Ajudância de Ordens;
Ailton Gonçalves Moraes Barros, ex-major do Exército;
Antônio Elcio Franco Filho, coronel do Exército;
Jean Lawand Júnior, coronel do Exército;
Filipe G. Martins, ex-assessor-especial da Presidência;
Carla Zambelli, deputada federal;
Marcelo Costa Câmara, coronel do Exército e ex-integrante da Ajudância de Ordens;
Marília Ferreira Alencar, diretora de inteligência do Ministério da Justiça;
Sivinei Vasques, ex-diretor-geral da PRF (Polícia Rodoviária Federal).

MEMBROS DO GSI

Carlos José Russo Assumpção Penteado, general do Exército, então secretário-executivo do GSI;
Carlos Feitosa Rodrigues, general de Exército, então chefe da Secretaria de Coordenação e Segurança Presidencial do GSI;
Wanderli Baptista da Silva Junior, coronel do Exército, então diretor-adjunto do Departamento de Segurança Presidencial do GSI;
André Luiz Furtado Garcia, coronel do Exército, então coordenador-geral de Segurança de Instalações do GSI;
Alex Marcos Barbosa Santos, tenente-coronel do Exército, então coordenador-adjunto da Coordenação Geral de Segurança de Instalações;
José Eduardo Natale de Paula Pereira, major do Exército, então integrante da Coordenaria de Segurança de Instalações do GSI;
Laércio da Costa Júnior, sargento do Exército, então encarregado de segurança de instalações do GSI;
Alexandre Santos de Amorim, coronel do Exército, então coordenador-geral de Análise de Risco do GSI; e
Jader Silva Santos, tenente-coronel da PMDF, então subchefe da Coordenadoria de Análise de Risco do GSI.

MEMBROS DA PMDF

Fábio Augusto Vieira, policial militar
Klepter Rosa Gonçalves, policial militar
Jorge Eduardo Barreto Naime, policial militar
Paulo José Ferreira de Sousa Bezerra, policial militar
Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues, policial militar
Flávio Silvestre de Alencar, policial militar; e
Rafael Pereira Martins, policial militar.

ENTORNO DE BOLSONARO

Tércio Arnaud Tomaz, blogueiro e suposto participante do chamado Gabinete do Ódio;
Fernando Nascimento Pessoa, blogueiro e suposto participante do chamado Gabinete do Ódio; e
José Matheus Sales Gomes, blogueiro e suposto participante do chamado Gabinete do Ódio.

ENVOLVIDOS NO 8 DE JANEIRO

Ridauto Lúcio Fernandes, general da reserva do Exército; e
Meyer Nigri, fundador da empresa Tecnisa.

FINANCIADORES

Adauto Lúcio de Mesquita, sócio da empresa Melhor Atacadista;
Joveci Xavier de Andrade, sócio da empresa Melhor Atacadista
Mauriro Soares de Jesus, sócio da empresa USA Brasil;
Ricardo Pereira Cunha, procurador de Mauriro e integrante do grupo Direita Xinguara;
Enric Juvenal da Costa Laureano, consultor da Associação Nacional do Ouro;
Antônio Galvan, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Jeferson da Rocha, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Vitor Geraldo Gaiardo, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Humberto Falcão, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Luciano Jayme Guimarães, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
José Alípio Fernandes da Silveira, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Valdir Edemar Fries, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Júlio Augusto Gomes Nunes, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Joel Ragagnin, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo;
Lucas Costa Beber, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo; e
Alan Juliani, integrante do Movimento Brasil Verde e Amarelo.

ATENTADO A BOMBA

George Washington de Oliveira Sousa, condenado pelo atentado ao Aeroporto de Brasília;
Alan Diego dos Santos Rodrigues, condenado pelo atentado ao Aeroporto de Brasília; e
Wellington Macedo de Souza, condenado pelo atentado ao Aeroporto de Brasília.

SUPOSTA CORRUPÇÃO NA PRF

Alexandre Carlos de Souza e Silva, policial rodoviário federal;
Marcelo de Ávila, policial rodoviário federal; e
Maurício Junot, sócio de empresas envolvida em licitações da PRF.

Da Redação


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